Um Dedo de Prosa
Poesias

O sapo Vuvuzela

Neste Brasil que é tão grande,

Mais parece um continente,

Muitas coisas acontecem

Cada qual mais diferente.

Vou contar uma que ouvi

E confesso que não vi,

Mas meu ouvido não mente.

Com destino a Pernambuco,

Saí de minas Gerais

Pois gosto de viajar

Para acalmar os meus ais.

Saindo dessa muvuca

Viajei para Ipojuca,

Onde tudo é muito mais.

Ipojuca é município

Do famoso balneário

Vila Porto de Galinhas.

Lá, deixei o meu salário

Mas fiquei muito feliz

Fazendo o que sempre quis:

Parecer um milionário.

No Marupiara Hotel

Fiquei então hospedado.

Alegre como criança

Olhava pra todo lado.

Diante da natureza,

Em meio a tanta beleza

Qualquer um fica encantado.

A tudo eu quis conhecer...

Brinquei na água do mar,

Pulei na piscina, enfim

Algo eu fui bebericar.

Louvei a Deus com alegria,

Pois tudo o que acontecia

Era de se festejar.

Mais tarde, estando faminto,

Satisfiz meu apetite

No restaurante do Hotel

Pra depois lá na suíte

Ir dormir com meu amor

Debaixo do cobertor,

Na melhor coisa que existe.

Então uma orquestra ouvi

No terreno logo ao lado

Que é um lote muito grande

Com o chão todo encharcado.

Sapos, grilos e girinos

Tocavam seus violinos

De um modo muito afinado.

O mar nas pedras bramia

E a bicharada cantava

Nessa mistura sonora

Que no brejo ressoava:

O mar com a percussão,

Os bichos com afinação...

E a natureza vibrava!

Com a pujança de vida

Extremamente pulsante,

Cada bicho, por instinto,

Cantava naquele instante:

Corpo, mente, coração,

Penetrando a escuridão

Com um som muito instigante.

Essa orquestra, toda noite

Era coisa rotineira

Que tocava com vigor

Aquele som de primeira.

Marés, coaxos e estrilados

Para humanos hospedados

Bem aos pés de sua soleira.

Aí o sapo jururu

Anunciou que um parente

Vindo de outras paragens

Telefonou de repente

Pra lhe dizer de estalo

Estar vindo visitá-lo.

Jururu ficou contente!

Vizinhança se assanhou

E ficou especulando

Quem seria esse parente

De tão longe, viajando...

Donde foi que ele saiu

Pra vir parar no Brasil,

Com o seu primo esperando?

Quase todo mundo tem

Na vida um primo distante

Morando em outra cidade.

De repente, num instante,

Faz contato e aparece,

A gente até agradece

Visita tão importante.

É raro um primo distante

Que a gente nem conhecia,

Aparecer de repente

Como fosse todo dia.

Isso geralmente ocorre

Se pelo boato que corre,

Ganhamos na loteria.

Mas jururu é tão pobre,

Pobre de marré-de-si...

Mora em poça tão pequena

Que mal cabe um lambari

E na vida se desdobra

Pra não ser manjar de cobra.

Pobre assim, eu nunca vi.

A partir de então se ouviu

Na folhagem, burburinho,

Disse-me-disse, fofoca,

Em cada grama e raminho.

Até eu, que agora rimo,

Especulei sobre o primo,

Depois saí de fininho.

Finalmente, o grande dia:

O primo logo chegou.

Mostrando ser educado,

A todos cumprimentou.

O seu porte era elegante,

Mostrou-se muito galante

E a rã até suspirou.

Porém, foi muito esquisito

Porque falava embolado,

Ninguém entendia nada,

Ficou meio complicado.

Mas então, vejam vocês,

Jurururu falava inglês

E tudo foi contornado.

Apensar da vida dura,

A valorosa amizade

É que então prevaleceu

Naquela comunidade.

E o jururu viu seu primo,

Distante desde menino,

Ficar bastante à vontade.

Naquele brejo encharcado

Na beira do mar azul,

Perguntaram logo ao primo

Se ele veio de Istambul.

Alisando o cavanhaque,

Respondeu com um sotaque:

- Sou da África do Sul!

Jogou longe o pensamento

Com um suspiro profundo,

Para falar de onde veio

Sem respirar um segundo.

E em seguida ele informou

Que o seu país sediou

Uma das copas do mundo.

Os moradores ouviam

Tudo aquilo que dizia

E à medida que falava

O jururu traduzia.

Sendo um sapo de renome,

Vuvuzela é o seu nome

Para toda a freguesia.

Com o novo sapo na área,

Sentimento se revela

Na gia, toda assanhada

Suspirando na janela.

Rãzinhas de mini-saia

Só ficavam de tocaia

Esperando o vuvuzela.

Em toda extensão do brejo,

Desse sapo se falava.

Por ser um sapo de fama,

O povo se admirava.

Tomados de acolhimento,

Aproveitando um momento

Perguntaram se cantava.

Vuvuzela, bem modesto,

Contou logo a sua história:

Na vida dos conterrâneos

Já faz parte da memória

Pois canta sim, sim senhor,

Tornou-se um grande tenor

Nos estádios de Pretória.

O povo logo aplaudiu

Ao sapo internacional

E ao convite logo feito

De modo bem informal,

O vuvuzela aceitou

E na orquestra ele entrou

Pois achou sensacional.

Vuvuzela deu início

À sua nova carreira,

Mas o som que ele emitia

Não passava de zoeira,

Parecia um buzinaço,

Verdadeiro estardalhaço,

Não era pra brincadeira.

Isso em nada parecia

Canto de acasalamento.

Era coisa tenebrosa,

Como um bombardeamento.

Até a cobra que é surda,

Achou a coisa absurda

E se mandou mata adentro.

Os bichos, em polvorosa,

Com um abaixo-assinado

Pressionaram jururu

Que ficou preocupado.

Perguntaram com vontade:

“ Onde está a Autoridade?...”

Que reboliço danado!

Fizeram até passeata

Naquele clamor geral.

Já queriam vuvuzela

De volta à terra natal.

Houve queima de pneus...

Jururu disse: - Meu Deus,

Isto está ficando mal.

Eu só sei que depois disso,

Com a grande confusão

Vuvuzela se calou,

Não soltou a voz mais não.

Não sei o que aconteceu,

Se foi cobra que o comeu

Ou se embarcou no avião.

O jururu, por sua vez,

Ficou muito aborrecido

Ao apartar-se de novo

Daquele primo querido.

E pra falar a verdade,

Eu dele sinto saudade

Porque fiquei comovido.

Cordel de Nhô Danilo Pereira

17 / Ago / 2008
Danilo dos Santos Pereira
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